sábado, 21 de fevereiro de 2009

Dentro de mim existe alguma coisa que espera a sua volta, de repente, não sei se pela janela ou se aparecerá novamente no mesmo lugar. Para prevenir surpresas, tenho deixado sempre abertas todas as janelas e todas as portas de todos os guarda-roupas. Enquanto não chega, preparo duas coroas de flores: uma para o túmulo de minha mãe, outra para o guarda-roupa que ele habitava.
[Caio Fernando Abreu, Réquiem por um fugitivo]



Há poucos sete dias tudo parecia outro. Eu, você, o teto do quarto. Ei!
Ei!
Hoje à noite, aquela mesma história que tanto nos alegra escutar: "a tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos".
"Eu tenho sete faces", me disse certa vez enquanto mastigava um pedaço de pizza. Eu eu, tonta, a esperar por todas elas.
Não vai me ouvir esta noite?
É que eu me calei há tempo... isso tampouco você percebeu. E se eu te pedisse pra me morder? Ou me dar um tapa, bem de leve. Um tapa.

Ainda está aí?
Oh, já se foi!
Eu também já havia ido, bem antes de você. Sei que você sequer havia notado. É que do outro lado eu continuei fazendo os mesmos ruídos, às mesmas horas do dia, pra você não sentir a minha falta. Pra não sentirmos.
E, sobretudo, pra que se um dia eu resolvesse voltar! Se um dia eu resolvesse voltar, bastaria abrir a porta às cinco da manhã, me deitar na cama, beijar tua face - "santa e nua" -, murmurar um sonolento 'bom dia', me aconchegar outra vez em seu peito e dormir mais um pouco. Como hoje de manhã! Você se ainda consegue se lembrar de todas as manhãs?